domingo, 11 de setembro de 2016

Casa de Seu Jorge

Eis aí mais uma oportunidade de debruçarmo-nos sobre uma foto do arquivo do documentarista Ademir (Nenem) Damasco. 



Essa foto nos remete a uma casa da Rua da Capela pertencente a um personagem emblemático da história do Povo do Campeche, Seu Jorge da Januária (sendo januária sua mãe)ou também conhecido como Jorge da Mena ( sua esposa). Essa é uma característica das comunidades de descendentes de açorianos que reconhecem seus moradores a partir do nome dos pais ou cônjuges. 
Nesta foto seu Jorge está sentado na porta de sua casa tomando um solzinho de inverno. Aparece segurando sua bengala pois já estava acometido de cegueira total. ,
Na comunidade era conhecido como um hábil vigia de pesca da rede da família Inácio. Sua cegueira foi provavelmente decorrente do diabetes mas como ainda era uma doença pouco diagnosticada, muitos creditavam sua falta de visão ao fato de passar horas e horas olhando para o mar na captura de alguma manta (cardume) de tainhas ou anchovas. 
Mesmo cego seu Jorge nunca abandonou a atividade da pesca,e ainda ajudava a puxar as redes. Nos arrastões colocava seu quinhão no samburá (balaio de cipó e bambu com alças) e ao apalpar os peixes reconhecia de qual espécie se tratava.
Seu Jorge gostava de um bom papo e era muito apegado a vida, manifestando sempre o medo de morrer. Cada vez que o sino da capela tocava anunciando mais uma morte na comunidade Seu Jorge exclamava em tom de preocupação: “Ai ai ai Mena, ai,ai,ai Mena, ai, ai, ai...”
Na casa, existia um puxadinho que era utilizado para guardar as ferramentas da lavoura e pesca ou para abrigar o fogão a lenha. Observamos ainda uma tábua pregada na soleira da janela da cozinha que servia de apoio para lavar e secar a louça. Estas são também características de uma moradia de descendentes açorianos.

Eis aí mais um pedacinho da história de nosso povo.

Hugo Adriano Daniel é professor e historiador -
profhugoadriano@gmail.com

Nenhum comentário: